Conheça um pouco mais sobre a técnica histórico-cultural Dinâmica do Tempo

Introdução 

Vigotski, em sua obra A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca, considera que a história do desenvolvimento de cada pessoa é semelhante a um drama, constituída em um cenário, com vários personagens e marcada por elementos emocionais e cognitivos os quais se articulam formando um todo único. 

Dentro desse enredo, se desenrolam muitas histórias, e cada uma delas deixa marcas que contribuem para a formação da personalidade das pessoas. Entretanto, em algumas situações, esse enredo se torna tão complexo, são tantos os desdobramentos, tantas as marcas, que a pessoa se perde em sua própria história, não reconhecendo mais os eventos que a trouxeram para o presente contexto.

Nesses momentos, o/a terapeuta histórico-cultural pode lançar mão da técnica Dinâmica do Tempo, formulada com o intuito de compreender como o paciente se relaciona com sua própria história.

A Dinâmica do Tempo 

Essa técnica foi desenvolvida pela profa. Dra. Ana Ignez Belém em seus processos de pesquisa no Laboratório de Estudos da Subjetividade e da Saúde Mental (LADES) na Universidade Estadual do Ceará. Tem por objetivo compreender como a pessoa em terapia narra sua história de vida, indicando os principais eventos que a compõem. Assim é possível verificar a maneira como ela se situa na constituição dessa história, compreendendo quais eventos são mais significativos para a formação de sua personalidade.

Nesse sentido, faz-se necessário destacar que essa intervenção está ancorada no conceito de desenvolvimento de Vigotski, tendo em vista que toda demanda clínica tem uma história – como se desenvolveu –, e investigar essa história é imprescindível para a caminhada terapêutica.

Através dessa técnica, diante da investigação do desenvolvimento do paciente, é possível fazer conexões entre os elementos que contribuíram com seu estado de adoecimento psicológico, por exemplo. Essa investigação deve partir do princípio de que a personalidade tem uma natureza dinâmica, e a utilização dessa técnica como mediador pode ampliar as possibilidades de aprofundamento da consciência do paciente sobre si.

Como se usa essa técnica?

Pedimos para que o paciente organize, em uma folha de papel, elenque os eventos significativos (positivos e negativos) que marcaram o seu desenvolvimento. Esse registro pode ser feito da maneira como a pessoa preferir (com datas, frases, desenhos, esquemas, textos corridos etc.).

Os procedimentos de pensar nos eventos ocorridos durante a vida, localizá-los historicamente, atribuir a eles um caráter significativo, observar quais as emoções foram produzidas em cada um desses contextos, todos esses processos levam o paciente a simbolizar melhor suas próprias vivências. 

Justamente por ser uma técnica que nos permite investigar amplamente os desdobramentos da vida, é que a Dinâmica do Tempo pode ser utilizada para investigar a história do desenvolvimento em contextos diferentes, seja com transtornos ansiosos, de humor, de personalidade ou em situações de violência sexual.

Por esse motivo, é preciso destacar que a utilização dessa técnica deve ser feita de maneira contextualizada e intencional, tendo como objetivo último contribuir para a caminhada terapêutica e possibilitar ao paciente uma consciência mais integrada de si, de suas relações história e do seu sofrimento psíquico.

Conclusão

A Dinâmica do Tempo é um recurso importante para a Clínica Histórico-Cultural, pois traz, desde sua constituição, o destaque vigotskiano à história do desenvolvimento, além de sinalizar que, para se compreender a complexidade de cada pessoa, é necessário entender a trama da vida. Através dessa ténica, mobilizamos o paciente para rever, refazer e recontar a sua história.

Leituras para aprofundamento:

  • Livro: A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca – Vigotski.
  • Capítulo de livro: A clínica histórico-cultural com adultos: desafios e descobertas (Cartas para Vigotski) – Neto Oliveira e Ana Ignez.
  • Livro: Práxis na clínica histórico-cultural: por uma clínicada transformação e do desenvolvimento – Ana Ignez e Neto Oliveira.