Como entender o desenvolvimento humano na clínica histórico-cultural? Veja o que Vigotski construiu!

O desenvolvimento humano há muito tempo é trabalhado por diversas abordagens teóricas da Psicologia, mas a Psicologia Histórico-Cultural, verdade seja dita, sempre foi uma teoria que se destacou na discussão desse tema — inclusive, na clínica.

Mas como a visão de desenvolvimento dessa teoria influencia na prática clínica? É isso que vamos descobrir neste texto! 

1. Ênfase no biológico ou no sociocultural?

Diferente do que se possa pensar em um primeiro momento, a Psicologia Histórico-Cultural não olha apenas para os aspectos culturais e sociais quando reflete acerca do desenvolvimento humano.

Como Vigotski é, muitas vezes, definido como um autor sociointeracionista, o leitor desavisado de sua obra tende a achar que os aspectos biológicos da evolução humana são desconsiderados ao se pensar o desenvolvimento.

A verdade é que natureza e cultura são entendidas de maneira inexoravelmente entrelaçadas quando se pensa o desenvolvimento das pessoas.

Isso quer dizer que tanto as características evolutivas da nossa espécie (filogênese), quanto as características específicas da sociedade construídas historicamente (sociogênese) são consideradas quando se observa o desenvolvimento do sujeito da concepção até a morte (ontogênese).

Assim, devemos deixar de lado qualquer tipo de determinismo, seja biológico ou social, quando pensarmos na concepção de ser humano a partir da Psicologia Histórico-Cultural. O que existe é uma relação dialética no desenvolvimento.

2. A Psicologia Histórico-Cultural divide o desenvolvimento humano em fases?

Se você tem interesse em entender o desenvolvimento humano na clínica histórico-cultural, pode se perguntar se Vigotski dividiu esse processo em fases. Quer saber a resposta?

Para o autor, nosso desenvolvimento é atravessado por algumas crises que acabam por gerar momentos de conflito do sujeito consigo mesmo e com os outros ao seu redor.

Essas crises são geradas pelo fato de que, em cada sociedade, há elementos culturais que criam exigências diferentes para as pessoas levando em consideração suas idades.

Ou seja, na medida em que o sujeito envelhece, aqueles ao seu redor começam a esperar dele novas condutas que, teoricamente, se adequariam melhor à sua etapa de vida. É comum que esses períodos sejam caracterizados por uma atitude de negativismo em relação a essas novas exigências, o que acaba gerando crises.

Tais crises, no entanto, representam o cerne do desenvolvimento humano, pois é a partir delas que se atingem novos níveis de desenvolvimento por meio de processos dialéticos entre o sujeito e o meio.

As crises e a periodização do desenvolvimento em Vigotski

Ao se observar a cultura na qual o sujeito se insere, é possível identificar algumas crises comuns ao contexto. Vigotski, por exemplo, identificou algumas dessas crises ao estudar a sociedade da União Soviética da década de 1930.

São elas:

  • crises pós-natal – primeiro ano (2 meses -1 ano);
  • crise de 1 ano – infância precoce (1 ano – 3 anos);
  • crise de 3 anos – idade pré-escolar (3 anos-7 anos);
  • crise dos 7 anos – idade escolar (8 anos-12 anos);
  • crise dos 13 anos – puberdade (14 anos-18 anos); e crise dos 17 anos.

É importante destacar que essas crises, que podem durar vários meses ou alguns anos, demarcam a transição entre uma fase e outra do desenvolvimento.

Então não seria errado afirmarmos que a Psicologia Histórico-Cultural enxerga o desenvolvimento humano a partir de uma sucessão de períodos. O mais importante, porém, é entender que Vigotski não falou de fases naturais do desenvolvimento.

Na verdade, a passagem pelas crises acontece na relação com a cultura, que modifica a atividade predominante que o sujeito exerce no mundo. Assim, por exemplo, é comum que a criança, na segunda infância, realize atividades ligadas ao jogo, que o adolescente realize atividades de estudo e que o adulto realize atividades de trabalho.

3. Como essa visão de desenvolvimento influencia a clínica histórico-cultural?

Sabendo que o sujeito é um amálgama formado por linhas biológicas e socioculturais, o(a) psicólogo(a) histórico-cultural que atua na clínica precisa entender profundamente dos estudos de desenvolvimento humano feitos por Vigotski.

É preciso levar em consideração os aspectos fisiológicos e genéticos relacionados às queixas trazidas pelo sujeito, bem como buscar as origens históricas delas. A visão do profissional deve ser global, visando à conscientização do sujeito em relação a todos os elementos que ajudam a construir sua personalidade.

Além disso, é importante identificar as crises pelas quais o sujeito já passou e entender se, naquele momento, está passando por uma. Afinal, sabemos que esses momentos são extremamente significativos, uma vez que envolvem as exigências as quais a pessoa está submetida em seu contexto sociocultural e o lugar que se espera que ela ocupe.

Por fim, é válido também investigar qual ou quais são as atividades predominantes do sujeito nesse momento de sua vida, pois sabemos que a atividade que este exerce no mundo influencia sobremaneira a forma como vê a si e aos outros.

Conclusão

Neste conteúdo você aprendeu que a visão de desenvolvimento humano da Psicologia Histórico-Cultural desconsidera determinismos e, ao invés disso, assenta-se em uma perspectiva que envolve a consideração do entrelaçamento entre linhas biológicas e socioculturais.

Você viu, ainda, que cada um de nós passa por crises em nosso desenvolvimento, que são geradas por novas exigências provenientes da cultura, criando as nossas novas atividades predominantes no mundo.

Sabendo disso, o(a) psicólogo(a) clínico(a) histórico-cultural deve entender do desenvolvimento humano, investigar a história de vida do sujeito, sem desconsiderar aspectos biológicos, e entender as crises e consequentes atividades predominantes dele no mundo!

E então, o que achou desse conteúdo? Caso tenha ficado com alguma dúvida, fala com a gente nos comentários!