Introdução
Na medida em que nos aprofundamos na Psicologia Histórico-Cultural, é possível identificar que alguns conceitos são base para a compressão do psiquismo nessa abordagem, um desses conceitos fundamentais é o de mediação. O desenvolvimento de todo o ser humano pressupõe a existência de mediadores que potencializam ou despotencializam a relação dos seres humanos entre si e com o mundo.
Em linhas gerais, mediação é a interposição de um elo intermediário na relação do ser humano com o mundo. Todavia, no intuito de explorar e ampliar o entendimento sobre o conceito de mediação, queremos mostrar para você formas de entendê-lo mais profundamente.
A constituição humana
A premissa básica da Teoria Histórico-Cultural está na afirmação de que os seres humanos são históricos e culturais. Assim, cada indivíduo se desenvolve à medida que se relaciona com outros indivíduos, imersos em uma cultura específica.
O ser humano é considerado um ser complexo, qualitativamente diferente dos outros animais e distingue-se das outras espécies porque não se limita ao mundo tal como ele se apresenta, mas o transcende e o transforma. Ele o recria constantemente, imprimindo nele a sua marca cultural. Por isso, Leontiev, em sua obra Desenvolvimento do psiquismo, afirma que o ser humano se humaniza produzindo o seu mundo, gerando suas manifestações culturais.
O conceito de mediação ocupa um lugar de destaque na maneira como essa teoria compreende a constituição humana, tendo em vista que, inicialmente, é a partir das relações interpessoais que a criança é introduzida na cultura e passa a assimilar o mundo, que é internalizado, formando significados e sentidos.
Pelo que somos mediados?
Ao considerar o fato de que a nossa relação com o mundo e com os outros não acontece de forma direta, ou seja, existe sempre um elemento que articula as relações, a Teoria Histórico-Cultural estabeleceu duas categorias de mediadores: os instrumentos e os signos.
A diferença entre os dois está na maneira como elas orientam o comportamento humano. Vigotski, em sua obra Formação social da mente, expressa que o instrumento constitui um meio pelo qual a atividade humana externa é dirigida para o controle e domínio da natureza; já o signo constitui um meio de atividade interna dirigido para o controle do próprio indivíduo.
O acesso a esses diferentes mediadores complexifica nosso desenvolvimento, pois nos coloca em contato com a produção histórico-cultural da humanidade que é, por excelência, material e simbólica. É através da influência desses mediadores que as funções psicológicas superiores são desenvolvidas.
Relação ou Interação?
Como já dissemos para você, o conceito de mediação é, por vezes limitado à ideia de interação, entretanto é necessário ampliar esse entendimento.
É importante ressaltar que o aspecto interacional não pode ser desconsiderado, tendo em vista que Vigotski não prescinde completamente das teorias do desenvolvimento que davam ênfase a essa dinâmica interpessoal. Entretanto, não podemos esquecer que Vigotski propôs críticas aos modelos que reduziam a ação dos mediadores a meras interações lineares, cumulativas, pois, compreendendo a dialética presente nas relações, era impossível estabelecer que existiriam apenas afetações unilaterais, ou seja, situações em que o indivíduo permaneceria passivo à ação dos mediadores.
Pelo contrário, Vigotski assegura que, durante o processo de desenvolvimento, cada indivíduo vai produzindo afetações que modificam a qualidade com que se dão as relações com o outro e com o meio, portanto a mediação não pode ser entendida como linear. Nesse sentido, podemos pensar que o próprio modo de viver dos indivíduos, as suas escolhas, os seus interesses, a sua motivação, vão se constituindo como mediadores que transformam também a realidade, formando um movimento de afetações que é relacional e dialético.
Conclusão
Diante do que vimos até aqui, é possível pensar a mediação como movimento relacional, dialético e complexo, que é fundamental para o nosso processo de desenvolvimento como seres humanos imersos em uma cultura. Também é importante ressaltar que os mediadores – instrumentos ou signos – sofrem transformações ao longo da história, se modificam qualitativamente, acompanhando os desdobramentos que ocorrem na cultura.
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Sugestões de Leitura:
- Livro: Desenvolvimento do psiquismo – Alexei Leontiev.
- Livro: Formação social da mente – Lev Vigotski.